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“quando recair sobre imóvel cujo valor supere o equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, deve observar a forma solene, efetivando-se, com isso, mediante escritura pública. (STJ – EDcl no REsp: 1938997 MS 2020/0254297-7, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 22/02/2022, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/03/2022)”
Dada nossa cultura nacional, as pessoas e empresas, quase sempre, por razões de conveniência ou economia, combinam a aquisição de um imóvel através de “contrato particular de promessa de compra e venda imobiliário”, todavia, são cientes que só terão a certeza de propriedade quando seus nomes constarem definitivamente como titulares dos bens no registro de imóvel.
Até onde vai a segurança de um contrato particular?
Pois bem, para responder esse questionamento iniciamos com uma diferença conceitual vital entre o Direito Público e o Direito privado, pois enquanto as regras que regem a atividade privada são abertas, ou seja, tudo que não está previsto em lei é permitido, no direito público, ao contrário, só é permitido fazer aquilo que está previsto em lei.
Por expressa determinação legal, os bens imóveis somente serão transferidos pela transferência de propriedade que, por sua vez, cerca-se de uma ordem de requisitos de formalidade e atos de eficácia, tornando-o um ato estritamente formal. Como se sabe, somente se efetiva mediante o ato de registro, segundo nosso sistema civil e registral, nos moldes do art. 1.245, do CC. Essa é, portanto, uma regra de direito público.
Justamente por essa série de exigências e formalidades a propriedade é absoluta (porque oponível a todos e capaz de oferecer ao titular do domínio sua ampla exploração), exclusiva (porque integral ao seu titular, não admitindo parcelamento do direito, senão da coisa) e definitiva (porque somente se desconstitui pela vontade do próprio titular, ou, excepcionalmente, pelo interesse público).
Apesar do art. 108 do Código Civil prever uma exceção que autoriza a negociação de imóveis através de instrumento particular, a regra geral é aplicação do sistema registral e notarial formal, onde a simples apresentação de um contrato particular não é o suficiente para assegurar o direito de propriedade, exigindo-se a prática de sua forma solene que se efetiva mediante escritura pública.
Somente a escritura pública e o posterior registro de propriedade conferem ao comprador o título de proprietário, de forma plena, segura e absoluta, pois confere ao ato a solenidade e publicidade necessárias, como ensina Afrânio de Carvalho (Registro de Imóveis. 1998):
“A publicidade dos direitos imobiliários pode ser organizada de mais de uma maneira, conforme a EFICÁCIA que a legislação lhe pretende atribuir. Essa eficácia varia em escoal de poucos graus, entre os quais, porém, a diferença é muito sensível para as relações jurídicas. De maneira geral, admite-se a configuração de TRÊS SISTEMAS principais de publicidade, que se revezam, com variantes, nos países da comunidade mundial. (…) O terceiro, ECLÉTICO, combinando o “TÍTULO” com o “MODO” de adquirir, de acordo com a doutrina romana, substitui a tradição pela PUBLICIDADE REGISTRAL, à qual concede o duplo efeito de CONSTITUIR O DIREITO REAL e de ANUNCIÁ-LO A TERCEIROS. Antes da publicidade, o ato cria obrigações entre as partes, mas, uma vez efetuada, perfaz a MUTAÇÃO JURÍDICO-REAL, investindo a propriedade ou direito real na pessoa do adquirente e, ao mesmo tempo, tornando o direito OPONÍVEL A TERCEIROS. Essa dupla eficácia é a do Direito Brasileiro desde a Lei Imperial de 1864″.
Enquanto não for registrada a escritura pública, o vendedor continua a ser havido como dono do imóvel e, inclusive, se outra pessoa fizer a escritura pública antes, receberá a propriedade plena, ainda que seu contrato particular tenha sido assinado antes. O “Instrumento Particular de Compra e Venda” é, em verdade, uma promessa de compra e venda, já que a publicidade dos direitos imobiliários é elemento de eficácia.
E pra que serve o contrato particular então?
Referido contrato é uma ferramenta do direito privado que cria direito obrigacional, ou seja, a obrigação de comprador e vendedor realizarem todas as formalidades necessárias para a transferência da propriedade, tais obrigações vinculam somente comprador e vendedor. Dentre outras obrigações, a título de exemplo, o vendedor não pode, por força do contrato particular, vender nem dispor novamente o imóvel e será responsabilizado civil e criminalmente por seu descumprimento.
Observados os requisitos legais, o contrato particular subsidiará a regularização da propriedade mediante a ação de adjudicação compulsória ou mesmo pela usucapião, todavia, enquanto vivos os contratantes, um caminho seguro é não deixar pra depois e realizar a escritura pública com registro.
O melhor caminho para a regularização, em qualquer caso, envolve a participação de um advogado especialista, conhecendo e avaliando o caso concreto, indicará o melhor caminho.
“INDISPENSÁVEL A ESCRITURA PÚBLICA. FORMA PREVISTA EM LEI. CARÁTER PURO E SIMPLES DA DOAÇÃO EVIDENCIADO. DESCABIMENTO DO PEDIDO DE REVOGAÇÃO. INTERPRETAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO CONFORME A REAL VONTADE DAS PARTES E A BOA-FÉ OBJETIVA. 3. Em interpretação sistemática dos arts. 107, 108, 109 e 541 do CC, a doação – por consistir na transferência de bens ou vantagens do patrimônio do doador para o do donatário, quando recair sobre imóvel cujo valor supere o equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, deve observar a forma solene, efetivando-se, com isso, mediante escritura pública. (STJ – EDcl no REsp: 1938997 MS 2020/0254297-7, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 22/02/2022, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/03/2022)”
Alexandre Pereira Costa
Advogado.